O filósofo educacional Cipriano Luckesi aponta três maneiras de compreender o sentido da educação na sociedade: educação como redenção, educação como reprodução e educação como um meio de transformação da sociedade.1 Pela sua busca de sentido e ensejo de ação, todas elas podem ser consideradas tendências filosófico-políticas. Sobre a educação como redenção, Luckesi destaca sua característica de enxergar a sociedade como “conjunto” de indivíduos que convivem em sociedade, bem como sua ênfase no desenvolvimento de habilidades e “veiculação dos valores éticos necessários à convivência social”.2 Para Dermeval Saviani, o sentido e finalidade da educação redentora é “reforçar os laços sociais, promover a coesão social e a integração de todos os indivíduos no corpo social”.3 Como se vê, educação e redenção é uma discussão até certo ponto “normal” no ambiente educacional.
Um exemplo clássico da concepção de educação como redenção encontra-se na conhecida obra Didática Magna, da autoria de Comênius e escrita no século 17. Partindo da compreensão de um mundo criado por Deus como harmônico e bom, o educador morávio descreve a perda dessa harmonia, e argumenta ser papel da educação a recuperação dessa harmonia perdida. Ele diz que “um dos primeiros ensinamentos que a Sagrada Escritura nos dá é este: sob o sol não há nenhum outro caminho mais eficaz para corrigir as corrupções humanas que a reta educação da juventude”.4
Em nossa contemporaneidade, no Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, o político e economista francês Jacques Delors, se bem que não pende para uma visão redentora, não deixa de enfatizar o papel preponderante da educação para os indivíduos e para a coletividade. Assim ele se expressa:
Ao terminar os seus trabalhos a Comissão faz, pois, questão de afirmar a sua fé no papel essencial da educação no desenvolvimento contínuo, tanto das pessoas como das sociedades. Não como um “remédio milagroso”, não como um “abre-te sésamo” de um mundo que atingiu a realização de todos os seus ideais, mas, entre outros caminhos e para além deles, como uma via que conduza a um desenvolvimento humano mais harmonioso, mais autêntico, de modo a fazer recuar a pobreza, a exclusão social, as incompreensões, as opressões, as guerras…5
A noção de redenção-educação6 é fundamental nos escritos de Ellen G. White. No ano de 1870, ela começou a publicação, em quatro volumes, do que considerava ser a história da redenção, intitulada The Spirit of Prophecy.7 Posteriormente, apresentou material adicional sobre o assunto, originando a série Grande Conflito,8 com pouco mais de 3.500 páginas. Para os Depositários da literatura de Ellen G. White, essa coleção permitiu que a igreja adventista e o mundo tivessem “conhecimento do grande plano da redenção humana e os propósitos de Deus em levar a cabo Seu plano original na criação do homem”.9
Considerando que o tema da redenção é fundamental na pedagogia whiteana, este artigo discorrerá sobre esse assunto, e se propõe refletir em questões como: Qual o sentido de uma educação redentiva em Ellen G. White? Porventura a redenção whiteana é de natureza apenas religiosa ou espiritual? Que elementos tornam a educação e a redenção uma só obra? Para elucidar essas questões, abordaremos três tópicos fundamentais: sua compreensão de redenção, a similaridade entre redenção e educação, e o impacto dessas idéias para a prática pedagógica.
Adolfo S. Suárez, doutor em Ciências da Religião
Professor nas faculdades de Pedagogia e Teologia, coordenador do Núcleo de Integração Fé e Ensino do Unasp, campus Engenheiro Coelho.